Hibridismo não é uma palavra nova e já foi usada em contextos dos mais variados, para o bem ou para o mal. O conceito volta agora à cena, desta vez ligado à educação, e parece que veio pra ficar.
Em boa parte do mundo crianças e jovens devem (ou deveriam) voltar às aulas. No hemisfério norte iniciando mais um ano escolar, enquanto em países como o Brasil, retomando o ano letivo depois das férias de inverno.
A pandemia exigiu flexibilidade e adaptação rápida, especialmente de quem trabalha com educação ou é estudante. Mesmo quem nunca pensou em dar ou tomar aulas online e quem, inclusive, era totalmente avesso à modalidade, adotou o lema “melhor isso do que nada”.
Na labuta de transformar um currículo pensado para aulas presenciais instantaneamente para aulas virtuais, fomos nos deparando com um novo vocabulário que inclui ferramentas e plataformas de ensino, estratégias para conseguir engajamento e até questões sociais e emocionais sobre as quais nunca tínhamos de fato pensado.
A desigualdade entre escolas e estudantes, que sempre fez parte da nossa realidade, tornou-se gritantemente evidente. Saíram na frente as instituições que já se preparavam para oferecer suporte online. Saíram na frente as famílias que tinham estrutura doméstica e equipamento para garantir que seus filhos fizessem a transição da forma mais serena possível.
Mais uma vez, ficaram pelo caminho aqueles cujo o espaço da escola era, com todas as suas deficiências, uma forma de fugir de problemas ainda maiores em casa. Foram particularmente afetados os muitos estudantes em situação de pobreza absoluta ou aqueles sem acesso a computador, serviço de internet ou aparelho celular e provedor de dados.
Mas não foram só eles. Pense numa família que tem, por exemplo, acesso à internet, um computador que tem servido bem às suas necessidades e agora se vê sem saber o que fazer porque tem dois ou mais filhos em idade escolar e tomando aulas nos mesmos horários…

E o que ensino híbrido tem a ver com isso?
Pois é…não estou mudando de assunto, não. Esta introdução é necessária para percebermos que justamente por representar uma combinação de aulas presenciais e online, o ensino híbrido tem sido apontado como uma possível solução em nosso atual contexto.
Seria a um tempo uma forma de ocupar o espaço físico da escola, agora abandonado, enquanto também atenderia a normas de segurança para a saúde de alunos, professores e funcionários. E mais, daria um respiro para quem não tem espaço ou clima adequado em casa.
Há várias propostas sobre a mesa, vindas de diferentes fontes ao redor do mundo. Por exemplo, rodízio de horários de uso das salas. Em muitos casos, as escolas forneceriam inclusive equipamentos para alunos que não os têm em casa. Nas escolas que oferecem merenda, por exemplo, as crianças que já faziam parte deste programa voltariam a ser atendidas pelo menos alguns dias da semana.
Professores e alunos com doenças crônicas pré-existentes ficariam sempre na equipe online. Docentes do grupo de risco poderiam ser assessorados nos encontros presenciais por professores assistentes, como estudantes de licenciatura.
De forma organizada, as salas teriam ocupação reduzida, com isso seria possível implantar o distanciamento físico recomendado pela Organização Mundial de Saúde. O tempo de aula presencial também encolheria, mas os grupos menores talvez potencializassem o melhor aproveitamento deste tempo.
Além do aspecto prático, e de seu potencial para amenizar a disparidade social na comunidade escolar, o ensino híbrido organizado desta forma seria também um pequeno mas muito bem-vindo alento a quem está com saudade dos professores, colegas e da rotina escolar, em si.
Mas ensino híbrido funciona mesmo?

O ensino e o aprendizado híbridos não tiveram início neste momento trágico. Nos Estados Unidos, por exemplo, distritos escolares em estados como Nebraska, Colorado, Maryland e Indiana já vêm experimentando este modelo por alguns anos.
Nesses casos, a implementação tem sido gradual, planejada e com o objetivo de desenhar experiências de aprendizado mais personalizadas, que atendam ao perfil de cada grupo. Além disso, a escolha pelo modelo híbrido se liga às novas tendências da educação, que consideram fundamental o ‘letramento digital’ como forma de preparar os estudantes para as demandas atuais.
O currículo e o planejamento de aulas são idealizados com base em evidências de pesquisas e experimentos. Como você pode deduzir, isso não tem nada a ver com mandar material para imprimir por WhatsApp, passar vídeos e PDFs e ter encontros com câmera ocasionalmente.
A questão que se coloca é: num cenário em que não há tempo nem recurso suficiente, é possível nos beneficiarmos do ensino híbrido?
A resposta depende de muitos fatores. Primeiro, é verdade que construir um programa totalmente baseado no ensino híbrido demanda um tempo do qual não dispomos agora e, no caso da educação pública, políticas quase inexistentes. Por outro lado, este momento com suas dificuldades nos permite aprender para, aos poucos, conseguirmos eventualmente ter algo mais próximo do ideal e tão bem estabelecido a ponto de ser uma opção educacional formal e não um ‘tapa-buraco’.
A seguir reuni alguns exemplos de abordagens e ideias que se encaixam na modalidade híbrida e que podem, ou não, fazer parte de um roteiro de experiências de aprendizado, de acordo com o perfil da escola, níveis de escolaridade e idade dos alunos, da disciplina e até da cultura escolar (algumas mais tradicionais, outras mais inovadoras).
- Sala de aula invertida: a abordagem já vem sendo usada em algumas escolas brasileiras. É uma saída perfeita para o ensino híbrido porque consiste exatamente em atividades pensadas para os ambientes da casa e da escola. Em linhas gerais, a sala de aula invertida acredita que as aulas expositivas podem ser substituídas por vídeos pré-gravados, muitas vezes pelos próprios professores da disciplina. Os alunos ouvem (ou leem sobre) o conceito em casa e se preparam para testar ou praticar o que aprenderam em atividades dinâmicas em sala de aula. É uma abordagem fantástica em tempos normais, mas talvez sofra com a impossibilidade de trabalhos em grupos, com mais espontaneidade e proximidade física.
- Plataforma intuitiva: num mundo ideal, o ensino híbrido teria de contar com um ambiente virtual de ensino padronizado para toda a escola ( e fornecido por esta) e de fácil acesso e compreensão para todos os usuários (alunos, professores e pais). A partir desta plataforma, os alunos teriam todo o necessário para checarem o material do curso e se comunicarem com seus professores e colegas, com segurança.
- Jogos: a onda da gameficação pode ser bem utilizada num sistema híbrido. Há muito que pode ser feito gratuitamente mas requer investimento de tempo para que se crie algo de fato significativo.
- Rotação por critérios específicos: como adiantamos acima, o ensino híbrido é adequado à realidade de uma pandemia porque seria possível dividir os alunos em grupos, de forma que quando uma parte deles realiza projetos em casa, a outra estaria na escola, e vice-versa. Mas é possível também pensar em outros tipos de rotação.
- Cumprimento de desafios: A experiência poderia criar espaço para aulas interdisciplinares sob um mesmo foco narrativo. Dessa forma, cada grupo de um determinado ano escolar teria um período de tempo, digamos cinco semanas, para cumprir uma jornada com uma série de desafios. Os grupos trabalhariam virtualmente, com coordenação remota dos professores envolvidos. Esta atividade exige muita autonomia dos estudantes e uma boa organização para que todos os grupos cumpram seus desafios de pesquisa e aprendizagem dentro do tempo previsto. Ex.: História/ Geografia/Biologia/Arte trabalhando juntos respectivamente os temas Egito Antigo- Rio Nilo – A poluição atual do rio – Símbolos e ícones visuais associados ao Egito Antigo. Os “desafios” podem ser específicos de cada disciplina mas teriam de ser pensados conjuntamente para que façam sentido como um todo.
Seja qual for o caminho escolhido, a comunicação é extremamente importante para que o ensino híbrido tenha sucesso. Além disso, o sistema avaliativo também deve ser revisto se quiser refletir com justiça e clareza a nova modalidade. Mas isso rende outro post, não perca! 😉
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