Ao pé do ouvido…

Histórias lidas, histórias contadas… e por que a oralidade pode nos ajudar a implementar o hábito da leitura e incrementar o prazer de ler entre nossos alunos.

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Antes de mais nada, quero deixar claro que não sou fã de áudio-livros, a nova mania mundial que virou um mercado em franca ascensão nos Estados Unidos nos últimos anos, e tende a crescer no Brasil também.

Não é por preconceito, entenda. Simplesmente, por um desses mistérios cognitivos, sou do tipo que absorve a informação melhor quando lê. Não sou boa de ouvido, digamos.

Ainda assim me impressiona muito o poder da oralidade entre as crianças, por exemplo. Se você tem filhos ou crianças por perto, já deve ter notado que em geral elas querem ouvir a mesma história muitas vezes. A filha de uma amiga, já chegava com o livro e pedia para que a mãe lesse sua história favorita três vezes no mínimo (e não estava aberta a negociações!).

Eu mesma me lembro de ler Harry Potter para meu filho, quando inclusive ele já podia ler. Aliás, dizem os especialistas que quando ouve uma história com ênfases, vozes engraçadas, emoção, as crianças têm mais vontade de ler. Nem poderia ser diferente. Mas isso quer dizer que se você lê sem vontade, com pausas nos lugares errados e sem entusiasmo, provavelmente o efeito não deve ser o mesmo. Então, como usar isso na escola, na sala de aula?

Entrou por uma porta saiu pela outra…

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Há algumas estratégias que podem se transformar em bem sucedidas ferramentas pedagógicas. Experimente:

Campeonato de leitura: Para colocar essa atividade em prática, é preciso ter uma turma já bem engajada e isso só você pode avaliar. Dependendo da habilidade de leitura, os sextos e sétimos anos podem ser bons candidatos. Nas aulas de língua, a depender do nível dos textos selecionados, pode ser aplicada a partir do A2 (CEFR).

  • Para a competição, escolha um texto curto, não mais do que duas páginas, com algumas palavras novas que possam oferecer alguns obstáculos.
  • Você pode começar com toda a classe, mas um simples erro, uma gaguejada e o aluno está fora. Os finalistas disputam a grande final com um texto de maior nível de dificuldade. Idealmente, a vencedora ou vencedor recebe um livro de presente, ou um vale-livro para escolher o que quiser.
  • Outra forma bacana, que envolve todo mundo, é dividir a classe em times. Cada time escolhe sua ou seu representante para as disputas. Neste caso, mesmo que nem todos os alunos leiam, eles estão ouvindo a leitura e fazendo dos alunos leitores uma espécie de ‘atleta’ da vez.  Você pode criar fases nessa modalidade também, a depender do número de alunos.  Por exemplo, os três melhores de cada equipe disputam a grande final, que pode ser uma ocasião e  até ter um ar festivo. Para quem tem biblioteca na escola pode ser a oportunidade de reservá-la para a  grande final!

Companheiros de leitura : Tive a oportunidade de testemunhar uma estratégia usada na abordagem Reggio Emilia em que as crianças de turmas mais avançadas liam para os menores. Por exemplo, crianças do terceiro ano liam historinhas uma vez por semana para os do primeiro.

Naquele caso, não era só a leitura que estava em jogo; era uma forma de combater o bullying. Uma criança maior, por algumas semanas, visitava uma vez por semana a classe dos menores. Eles eram então colocados em pares. Isso criava um laço entre eles. Meu filho participou dessa experiência dos dois lados. Lembro que ele adorava quando era pequenininho poder cumprimentar seus ‘reading buddies‘ nos corredores da escola. Ele se sentia o máximo porque os meninos e meninas mais ‘velhos’  o conheciam pelo nome! E da mesma forma,  adorou quando chegou a vez de ele próprio ler para os pequenos. Ele almejava por esse dia e sentia uma tremenda responsabilidade com os pequenos: queria ser um modelo!

O mais bacana é que enquanto a criança leitora se esforça para ler bem, a criança menor começa a achar que ler é uma coisa superlegal, afinal, os maiores fazem isso! Este programa, obviamente, precisa ser muito bem coordenado e supervisionado o tempo todo. É preciso preparar os leitores tanto quanto os ouvintes e definir espaços e em que contextos as leituras podem acontecer. Enfim, requer trabalho, como quase toda boa atividade. De qualquer forma, vale experimentar!

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Cachorros, bichinhos e um canto de leitura

A onda de ter cachorros treinados para ouvirem a leitura das crianças começou oficialmente nos Estados Unidos, em 1999, e passou a ser adotada em vários outros países, incluindo a Inglaterra. Há evidências que a presença de cachorros pode criar um clima mais relaxante e de afetividade (embora eu conheça alguns cachorros malucos que não se aplicariam a esta teoria!) e isso no caso dos leitores iniciantes significa que há menos pressão e nenhum julgamento. Afinal, não se sabe de nenhum cachorro que fez cara feia durante a leitura ou reclamou…

Muitas escolas passaram a ter mascotes bem treinados, cujos donos levam seus cachorrinhos como voluntários em escolas. Como talvez isso esteja um pouco aquém da maioria das escolas brasileiras, uma solução que pode ser usada (e já vem sendo testada) com crianças menores, em fase de alfabetização, é substituir o animal real por bichinhos de pelúcia. Em pequena escala, pode render bons resultados.

E dá pra ir mais longe sem sair do prédio da escola. Pense, por exemplo, em criar um espaço (uma sala secreta!), decorada com almofadas coloridas, imagens bonitas nas paredes e ursinhos fofinhos! (Olha aí que ideia para uma atividade casada com os professores de arte!).

De repente, um dia por semana, você leva alguns grupos pra este pequeno ‘refúgio’ com muitos livros infantis coloridos e cada um deles tem de ler algumas histórias para um bicho diferente. E, detalhe, um dia por mês, ela ou ele vai ter permissão de levar o ursinho pra casa para fazer a leitura lá! Que honra!

Para alunos maiores, o mesmo espaço pode ser adaptado e pode-se criar uma seção para se ouvir áudio-livros em capítulos (você pode determinar um número de capítulos por visita). É sabido que ouvir o livro não substitui a leitura silenciosa, mas pode ser um modelo interessante para os leitores hesitantes e no caso dos professores de línguas estrangeiras, pode demonstrar efetivamente a seus pupilos um modelo de pronúncia e intonação nativas.

Dependendo do lugar onde você ensina, isso tudo pode parecer puro sonho. Mas não conheço ninguém que tenha realizado alguma coisa que não foi sonhada antes. Além disso, que vida chata leva quem descarta tudo o que parece sonho antes mesmo de tentar, não é?

Boas leituras a todos!

Crédito das imagens pela ordem em que aparecem: Pexels CC0 (foto em destaque e as duas primeiras)/ Cortesia de phatrapong da freedigitalphotos.net/
Se você tem experiências na sala de aula ou ideias bem sucedidas que gostaria de compartilhar, não importa qual seja sua disciplina, entre em contato e faça parte dessa conversa.

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